terça-feira, 8 de outubro de 2013

Afogados no trânsito

Hoje o mundo produz duas vezes mais carros por ano do que há duas décadas. Em cidades como São Paulo a frota cresceu 50% de 2001 pra cá. O que fazer para matar o trânsito?Tirar você da jogada.

    Há quem diga que o problema do trânsito em metrópoles como São Paulo está em vias de ser resolvido: assim que todos os carros pararem de vez, incapaz de trafegar em direção alguma, é só asfaltar por cima e começar tudo de novo.
    O pior é que estamos quase lá. Até outro dia São Paulo tinha 4 milhões de carros se espremendo por suas avenidas. Isso era em 2001. Hoje são 6 milhões. Um salta de 50%. A cidade está parando: cada motorista passa quase 3 horas engarrafado por dia, em média.
    No meio dessa muvuca de carrocerias também estão empacadas alguns serviços essenciais para qualquer cidade. A manutenção da rede elétrica, por exemplo. Um dos motivos para que hoje os brasileiros passem mais tempo sem luz do meio da década para cá é que os carros do pessoal que cuida da rede demoram mais para chegar onde precisam. É o que dizem as empresas de energia. Se uma árvore cai num poste elétrico e isso deixa algumas quadras sem luz, o blecaute vai durar mais do que antes simplesmente por que o povo da manutenção fica mais tempo engarrafado. 
   A solução para o problema é a que todo mundo conhece. Transporte coletivo amplo e decente. Mas em cidades com ritmo de crescimento caótico, sobretudo em países em desenvolvimento e que ainda enfrentam as consequências  de uma recente exploração demográfica, mesmo com o investimento público no setor fica difícil acompanhar a demanda.
  Por outro lado, São Paulo e outras cidades à beira de parar têm planos ambiciosos para expandir suas linhas de metrô e agregar ao sistema de trens quebra-galhos de luxo como os monotrilhos - veículos que andam em passarelas por sobre avenidas, num estilo similar ao que os visionários da equipe de Walt Disney conceberam para permitir o transporte em seus parques temáticos na Flórida.
   Com esforços assim, ao longo de muitos anos, uma cidade começa a caminhar na direção de metrópoles que, se não acabaram com o trânsito, pelo menos viram ele parar de piorar. Foi o caso de Londres que, além bombar o transporte público, fechou o cerco aos automóveis particulares. Hoje o metrô atinge quase a cidade toda e periferia e recheada de linhas de trem. Os carros?Sim, eles estão lá. Continuam sendo objeto de desejo e divertem seus donos. Mas não passam tanto tempo na rua: custa caro sair com eles.O londrino que quiser pegar seu minicooper e ir para o trabalho tem que pagar R$ 25 de pedágio para entrar nos bairros centrais da cidade. Parece pouco, mas dá R$ 6 mil por ano para usar de segunda a sexta - uma fração considerável do preço de um minicooper, aliás, que sai por R$ 40 mil lá.
  Acabar com os carros virou uma utopia moderna. Essa cajadada mataria vários coelhos de uma vez só: trânsito, poluição e uma parcela considerável das emissões de gases-estufa. Mas isso também derrubaria uma das vigas de sustentação da economia mundial. A produção de carros dobrou entre 1991 e 2008, chegando a 70 milhões de veículos novos por ano. isso foi fundamental para gerar mais empregos em áreas tão díspares quanto a mineração, que tira da terra o ferro que vira aço das carrocerias, e a computação, que desenvolve os chips que comandam o motor dos carros flex. Boa parte da recuperação pós crise da economia americana é creditada ao programa cash for clunkers( dinheiro por saucata), em que o governo dava um cheque de US$ 4500 a quem quisesse trocar seu carro velho por um zero.
  Além disso, com ou sem trânsito, o carro continua sendo a 2ª compra mais desejada pela maioria dos mortais - atrás apenas da casa própria. E os carros que não poluem deixaram de ser ficcão há anos. Basta uma rede capaz de distribuir hidrogênio, um combustível limpo, ou energia para futuros carros elétricos que o problema da poluição e do efeito estufa acaba - isso se a eletricidade também vier de fontes amigáveis com a natureza, claro, mais aí é outra história. O ponto é que, se quisermos uma solução para o trânsito, temos de considerar um futuro com tantos ou mais carros do que hoje. Fazer o que então??
O PROBLEMA: VOCÊ
Uma das soluções que mais prometem é tirar você do volante: fazer com que o carro converse com o GPS (Sistema de Posicionamento Global) e se dirija sozinho, pelo menos nas áreas mais agitadas das metrópoles. Convenhamos, somos péssimos motoristas. Nós nos distraímos com facilidade, somos responsáveis - coletivamente - por mais de 90% dos acidentes de trânsito e nossa resposta lenta aos semáforos ajuda no congestionamento.Como?
  Quando um semáforo abre, o motorista na primeira fila leva em média um segundo ou dois para colocar o carro em movimento. O carro quem vem imediatamente atrás reage ao avanço do primeiro, e consome mais um segundo ou dois para avançar. O terceiro, guiado pelo segundo, acumula mais de dois segundos de atraso. E assim por diante. Numa fila de 10 carros, são perdidos 20 segundos, que serão descontados no tempo que o semáforo permanece no verde. Quem nunca se perguntou, num momento de frustração: "O sinal abriu!Por que ninguém anda?!"
   Agora imagine um sistema de controle remoto em que um computador coordenasse todos os carros em uma avenida. Ao abrir o semáforo, ele colocaria todos ao mesmo tempo em movimento, sem risco de batida e ganhamos os precisos segundos que de outro modo seriam perdidos. Esse conceito de "condução em pelotão" é uma coisa estudada a sério pelos engenheiros e pode virar realidade nos próximos anos. Esse sistema não tiraria completamente o motorista do volante. Ele seria aplicado só nas avenidas onde isso fizesse sentido: seja para evitar congestionamentos, seja para aumentar a segurança. 
   E, devagarinho, a gente deve chegar a esse futuro. A Darpa, agência de pesquisa tecnológica do Exército Americano, realizou algumas competições com prêmios polpudos a quem desenvolvesse automóveis capazes de autodireção. O vencedor de 2007 completou um percurso urbano ( mas, sem congestionamento) de 96 km em 4 h 10 (média de 22 km/h). 
  "O desenvolvimento tecnologias para veículos com direção autônoma, e para veículos que não batam, aparecerá nos próximos 5 a 10 anos" diz Lerry Burns, que até outubro foi vice-presidente e planejamento estratégico da General Motors, nos EUA. Mas, por enquanto, a única solução realmente ao alcance do motorista é ligar o rádio, ouvir um som e relaxar, trancado em meio a um mar de automóveis.

NÚMERO DE CARROS AQUI, NOS EUA E NO MUNDO.
BRASIL: 24 MILHÕES
EUA: 250 MILHÕES
O RESTO: 526 MILHÕES
SÓ EM SÃO PAULO CAPITAL: 1 CARRO A CADA 1,8 HABITANTE (5.951.686 AUTOMÓVEIS NA CAPITAL PAULISTA)

Revista Superinteressante DEZ 2009
Texto Salvador Nogueira e Alexandre Versignassi
   

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